Oies Bookaholics!
Eu quero mais foi uma das últimas leituras que mais me instigaram ultimamente. Publicado de forma independente pela autora nacional Tayana Alvez, o livro está disponível no formato e-book no site da Amazon e também disponível no serviço do Kindle Unlimited.
Não há spoilers nessa resenha!
Amazon – 2019 – 509 Páginas – New Adult
Aos dezenove anos Elizabeth se mudou do interior do Rio de Janeiro para a capital de São Paulo com a intenção de conseguir seu diploma de Jornalista e trabalhar com o que sempre sonhou, rádio. Deixar para trás a estabilidade e segurança da casa dos pais a assustou, mas com o apoio do melhor amigo – Joaquim Hernandez – ela decidiu lutar para conquistar o que sempre quis.
No primeiro dia de aula, Elizabeth conhece Breno e o riso fácil, o sotaque arrastado e as covinhas encantadoras dele fazem com que ela se sinta bem recebida em meio ao total desconhecido. Pouco tempo é necessário para que ela encontre nessa amizade a possibilidade de finalmente pertencer a algum lugar, já que todas as vezes que ela sorri com as surpresas de São Paulo, Breno sorri de volta como quem quer apresentá-la a cada pedacinho desse mundo novo. Ainda assim, seu coração não consegue esquecer o amor que lhe roubou o chão, muitos anos atrás.
Em meio a hostilidade de um ambiente elitista, novas amizades, relacionamentos tóxicos, dores do passado e um amor surpreendente, ainda existe uma questão a ser respondida: Será que existe algo que o amor não pode superar?Uma leitura diferente de todos os romances que já cruzaram o meu caminho. (…) Real, humano, desafiador e apaixonante. Um livro de estreia que enche de orgulho quem acompanha a Literatura Nacional. — L. C. Almeida. Autora Best Seller da Amazon.
Uma leitura que nos obriga a valorizar nossa felicidade, sem pensar muito no futuro. Um romance que nos exige uma resposta para os afetos, sem adiar os sonhos. Lizzie sabe que tudo dependerá de suas escolhas.
Amanda Melo — Faces em Livros.
Sou eternamente grata à Aione Simões (Minha Vida Literária) que indicou o meu blog à autora Tayana, que vinha buscando parceiras para o lançamento do seu primeiro romance. A Aione também cursa Letras e já fizemos algumas disciplinas juntas, e já chegamos a conversar diversas vezes. Enfim, rs. Tenho conversado com a Tay desde meados de abril e logo que vi a sinopse de Eu quero mais e a proposta de parceria eu fiquei encantada e ansiosa para conhecer a história da protagonista Elizabeth.
Representatividade importa sim
De uns tempos para cá eu tenho procurado livros, filmes e séries que trouxessem personagens negros no protagonismo. Pode ser besteira, mas depois que você se vê cada vez mais reconhecido como uma pessoa não branca e sente orgulho de seus traços, fica impossível ignorar a falta de personagens que lhe representam. Eu fico extremamente feliz em ver que há autores negros, e principalmente autoras negras brasileiras, que têm desenvolvido histórias a partir de suas experiências, e contribuindo dessa forma para uma literatura mais igualitária. Conversando com a Tay durante a leitura, e tratando especificamente da questão da representatividade, a autora me disse que trazer uma protagonista negra era ao mesmo tempo tratar das questões de gênero e raça, esta última principalmente por ser algo indissociável.
Isso significa que até os dias atuais, falar sobre a experiência do negro na sociedade é também tratar do racismo. Elizabeth sai de Campos de Goytagazes, região do interior do Rio de Janeiro para São paulo, com o intuito de cursar jornalismo em uma das melhores universidades do país. Além de sair da zona de conforto para encarar uma nova fase de sua vida, Elizabeth precisa lidar com o racismo nas pequenas obervações no campus da faculdade:
Não precisei de mais do que duas semanas de aulas para perceber que a quantidade de negros por turma é pequena e algumas aulas não contam com nenhuma pessoa negra além de mim. Não dá para dizer que isso não é intimidador, mas prefiro olhar pelo lado do desafio. Talvez eu seja mesmo a única negra aqui, agora, mas eu se eu não estivesse aqui, se não tentasse conseguir esse espaço, outras pessoas poderiam achar que esse lugar não é para elas. Já senti isso em relação a muitas outras coisas, e não é um sentimento legal.
Pode até parecer besteira, mas a representatividade é algo que realmente importa. Eu sou uma das poucas mulheres negras no curso de Letras da USP, um dos maiores cursos da universidade e no meu ano de ingresso eram um pouco mais de 800 novos alunos. Depois que passei a observar melhor, percebi a pouca quantidade de negros na sala de aula, mas isso só começou a me incomodar a partir do momento em que eu passei a me enxergar como negra e ter orgulho dos meus traços e da minha identidade.
Ao desenvolver a personagem de Elizabeth a autora também discute outras questões referentes à mulher negra, principalmente em relação aos seus traços o que bate de frente com o ideal de beleza desejado que muitas vezes não considera a mulher negra, com cabelos crespos como padrão:
Estou cansada de achar que foi uma grande sorte nascer com esses olhos e o nariz da mamãe, já escutei tantas vezes “Que sorte que veio com esse olho”, “Nossa, você é tão linda, seu olho é incrível”, “Levanta a mão e agradece pelo seu nariz ser fininho”. Não gosto disso (…) E eu não gosto de ser objetificada pelo meu “corpaço”, não gosto de ouvir que eu tenho “a cor do pecado”, odeio que as únicas coisas que chamem atenção em mim positivamente sejam meus olhos claros e meu nariz fino, ou seja, meus traços de branca.
Simultaneamente há também uma visão um tanto estereotipada do corpo negro, como o sociólogo Stuart Hall destaca em seu ensaio The spectacle of the other ao trabalhar as questões das representações dos negros em campanhas publicitárias. Ele menciona tanto a visão sobre o corpo forte dos atletas, até as animalizações, como também a sexualização dos genitais masculinos.
As pessoas já olham para mim e dizem “Ai sua cor/seu cabelo são lindos, eu acho um dos tons de pele mais bonitos e expressivos”, como se estivessem admirando ou um animal no quadro do Louvre ou um animal no zoológico e não ser um humano normal.
No curso de jornalismo Elizabeth também precisa aprender a lidar com as grandes diferenças que encontrará na sua profissão, já que a realidade não é muito promissora. Além da falta de profissionais negros em número de igualdade ao de pessoas brancas, muitos enfrentam ataques racistas pela internet, um meio que acaba por empoderar esse tipo de atitude, como no caso da jornalista Maria Julia Coutinho:
Existia uma barreira em ser telejornalista negro no Brasil, e se você não fosse a Glória Maria, certamente não tinha o direito de estar em destaque ali. Não que Glória não sofresse ataques, não é isso, mas pelo tempo que ela tinha de carreira, era fácil ouvir, “Mas tem a Glória Maria” (…) Como se o problema pudesse ser resolvido como uma única pessoa quando, na verdade, outras jornalistas negras como Joyce Ribeiro estavam recebendo críticas ao seu trabalho através da internet. Estaria tudo bem se as críticas fossem construtivas, afinal, ninguém nasce perfeito. Está tudo bem criticar o trabalho das pessoas, mas em momento nenhum consegui encarar “Esta negra chata, vesga, gaguejando na bancada do jornal é deprimente, fora Joyce Sebastiana crioula, volta para o tronco”, como uma crítica construtiva.
Desenvolvimento da trama
Como eu mencionei anteriormente a história de Elizabeth nesse nova jornada acaba por trazer demais aspectos na trama. Somos inseridos na aventura de um novo começo, a cidade de São Paulo como cenário, um lugar completamente novo, com novas interações, o início da vida adulta longe da família, do lugar de refúgio e porto seguro, as aspirações profissionais e acadêmicas. Tudo isso envolto de diversas referências a filmes, séries e músicas, aliás, esse é um dos pontos centrais da trama, visto que em cada capítulo há referência a uma canção, formando uma trilha sonora com músicas de Legião Urbana e Los Hermanos, e mais alguns outros.
Eu quero mais não se limita apenas à questão de raça e gênero, mas também em relação aos relacionamentos com a família, novas amizades e relacionamentos amorosos. Ao mesmo tempo em que a escrita da Tayana Alvez é envolvente e fluída, por conta dos acontecimentos me vi obrigada a fazer algumas pausas para respirar bem fundo.
A autora trabalha de uma maneira que me tirou da minha zona de conforto e me fez questionar meus princípios como verdade única e absoluta. Isso porque eu fiquei muito intrigada com a relação entre Elizabeth, Breno e Joaquim, nunca me vi nas situações retratadas e por isso senti muita dificuldade em entender as atitudes da protagonista, chegando mesmo a ter uma certa irritação pelo seu modo de agir, o que foi acentuado pela narrativa ser majoritariamente sob a perspectiva dessa mulher. Mas conforme a leitura foi progredindo eu fui entendendo que pelo fato de eu não ter vivenciado experiências semelhantes eu não teria condições de julgar Elizabeth. É bem aquela coisa, só quem passa por uma determinada situação sabe bem o que está sentindo, e quem está de fora consegue ter apenas uma visão superficial.
Sem me aprofundar em detalhes na intenção de evitar spoilers, a questão é que entre Joaquim e Breno há situações extremamente complexas. Um deles é o melhor amigo de Elizabeth desde sempre e seu primeiro amor, mas que devido a diversos fatores acabaram se separando e mantendo uma amizade muito próxima, como se o relacionamento amoroso não tivesse de fato esclarecido, devido à forte atração e sentimento que sente um pelo outro. Por outro lado, há também o nascer de uma novo relacionamento, alguém que se mostra amigo, cúmplice, mas que com o passar do tempo se mostra tóxico, minando a personalidade de Elizabeth.
Construção de personagens
Até determinado ponto a gente acha a relação da Elizabeth com seu novo namorado muito normal, isso porque além de termos a perspectiva dela, a construção dos personagens colaboram para nos colocar em dúvida. A autora constrói seus personagens não de maneira rasa ou estereotipada, isso significa que, nós como seres humanos temos diversas camadas, não somos 100% “bonzinhos” ou 100% “vilões” o que nos deixa questionando as atitudes de todos os personagens.
Até certo ponto consideramos o novo namorado um amor, afinal ele é romântico, amigo, cuida e se preocupa com ela. Por isso, achei extremamente importante a inserção de diálogos entre Elizabeth e suas amigas Carol e Aline, porque no momento em que elas discutiam algo saíamos da visão da protagonista para entender melhor o tipo de relacionamento e não achar normal ou naturalizar atitudes completamente abusivas. E ainda, ao mudar o foco narrativo nos últimos capítulos podemos compreender melhor as consequências de um relacionamento abusivo na vítima, suas mudanças de humor e desenvolvimento de alguns sinais de tensão por qualquer situação, levando a choros compulsivos até então sem nenhuma justificativa.
Alguns personagens me deixaram tão intrigada que eu queria conhecer mais deles, especificamente a Aline e o Paulo, colega de quarto e irmão de Elizabeth, respectivamente. Suas histórias me deixaram ansiosa para conhecê-los mais a fundo, conhecer seus passados para tentar compreendê-los melhor, quem sabe a autora se convença a criar mais conteúdo desses dois, eu ficaria extremamente grata. E sim, isso é uma indireta mesmo! Hahaha
Por fim, posso dizer que Eu quero mais foi uma leitura que me desestabilizou em diversos momentos, me provocou, apertou o coração e me fiz rir em outros, me fez sentir esperança. Eu quero mais é um livro que não termina com a leitura da última página, é uma história que propõe discussões, e que te deixa refletindo o tempo todo, eu particularmente fiquei impactada dias após concluir e sem palavras para raciocinar de forma coesa os meus sentimentos com essa experiência. Acho que até seria uma leitura fundamental para clubes de leitura, com rodas de discussões e até sessões com a autora, seria um sonho meu?
Fico mais feliz ainda por ter acreditado nessa história somente pela sinopse e de não ter me frustrado diante das minhas altas expectativas. Sou grata a autora Tayana Alvez não só por escrever a história de Elizabeth, mas a partir desse romance tomar o nosso lugar de fala na literatura de maneira real e verdadeira.
Até o próximo post!
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Meu Deus Camila, essa é uma das melhores resenhas que eu li na minha vida, e não, não é de uma das melhores resenhas do meu livro, é uma mas melhores resenhas at all, foo bonito ver seu POST. Os pontos que você separa, como organiza… Enfim, eu amei.
E nossa, obrigada por acreditar no meu livro, obrigada por compreender minha menina, obrigada por não torcer o nariz pro meu mocinho, obrigada por ter sido uma parceira incrível, e beeeem, pelo andar da carruagem teremos dois contos futuramente, é isso? Aline e Paulo, então? Haha.
Eu tô amando que todo mundo quer mais desses dois!
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Ai meu Deus, eu nem esperava por isso, de vdd! Caraca! ❤ ❤ Eu quero mais de Aline e Paulo, plis (olha o trocadilho hahaha) … Agradeço demais por essa experiência num todo! E ah: servimos bem para servirmos sempre! 😉
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Oi, Cah! Que bom que esta leitura te proporcionou essa reflexão toda e que preencheu suas altas expectativas! E que honra ter um comentário desse da própria autora hahaha, mas eu concordo com ela, além de super bem escrito, como sempre, gostei da divisão dos pontos levantados. Fiquei com vontade de ler 😍
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Oies Isa, mesmo viajando ainda deixa sua presença registrada por aqui! ❤ Mulher, vc viu? A Tay é maravilhosa ❤ Obrigada pelo apoio, como sempre! Saiba que o sentimento é recíproco 😉 E por favor, leia "Eu quero mais" é uma experiência incrível! Bjos da Cah ❤
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[…] Sem dúvida a melhor leitura do mês e fiquei muito feliz por essa parceria! ❤ Confiram: Resenha | Eu quero mais, de Tayana Alvez. […]
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[…] Eu tive a chance de conhecer diversos autores nesse ano, mas esse livro consegue representar bem. Resenha | Eu quero mais, de Tayana Alvez ❤ […]
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[…] que muito da minha percepção teve influência direta com o livro Eu quero mais, de Tayana Alvez, que para mim conseguiu trabalhar melhor essa questão. Inclusive eu cheguei a conversar muito com […]
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Parabéns, pela resenha, Camila!!! Adorei a análise! Bjs!
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Oies Ju! Obrigada ❤ ❤
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[…] passado tive a alegria de conhecer a autora Tayana Alvez a partir do seu primeiro romance Eu quero mais, uma das minhas melhores leituras de 2019. Nesse mês de fevereiro a Tay lançou mais um livro, O […]
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