Oies Bookaholics!
Esse livro é o número 22 da Coleção Grandes Nomes da Literatura, publicada em 2016, pelo jornal Folha de São Paulo. Eu tenho a coleção completa e uma das metas de 2018 era ler estes livros, já que ficaram um pouco (na verdade muito) abandonados na minha estante. E só para recapitular como funciona o projeto de leitura, eu faço um sorteio com o próximo livro a ser lido e pronto, eu leio! 😉
The Bell Jar – Coleções Folha – 2016 – Clássicos – 240 Páginas – 4/5
Sinopse: Dois anos antes de suicidar-se em 1963, a poeta Sylvia Plath elaborou esse romance sobre uma mulher – no fundo, ela mesma – que vai perdendo o senso até que sobra só um surrealista e vazio senso comum.
Agora imaginem uma pessoa que estava com um certo “medinho” ao ler esse livro, já que via várias pessoas alertando que seria uma leitura que mexe muito com a cabeça, e que poderia deixar mal. Posso dizer que o livro não me afetou tanto porque as minhas últimas leituras, no geral, têm a temática da depressão e suicídio, então eu já estava amortecida para o que viria.
- Enredo
Aos 19 anos, Esther Greenwood, a protagonista de A redoma de vidro, é uma mulher que sempre se dedicou aos estudos, e como consequência, foi recompensada pelos seus esforços ganhando uma bolsa de estudos numa universidade super conceituada no Estados Unidos (não sendo mencionada qual universidade especificamente). Apaixonada pela escrita e literatura teve vários destaques e premiações, entre elas, o trabalho de um mês numa revista de moda em Nova York. Tudo parecia soar perfeitamente incrível para quem saiu dos subúrbios de Boston para a cidade grande, mas para Esther as coisas estão muito longe de serem perfeitas, já que se sente vazia, a ponto de ter vários pensamentos suicidas, levando-a a momentos críticos. E ainda, o ponto de vista desta mulher em relação aos relacionamentos amorosos, familiares e profissionais.
- Fluxo de consciência
Narrado em 1ª pessoa, somos imergidos nos sentimentos angustiantes da protagonista, afinal ela está em um estado de depressão. Mas ainda assim, a narrativa flui de forma fluída e rápida, contando com algumas sacadas irônicas e engraçadas de Esther. Permeado por fluxos de consciência que interrompem o tempo linear do presente com os fatos do passado, não senti que deixaram a leitura confusa, monótona ou cansativa, isso porque eu tenho muita dificuldade em ler histórias que utilizam essa técnica narrativa. Cabe ainda recorrer à linguagem usada por Sylvia Plath: não é uma escrita rebuscada, (pelo menos nessa edição que foi traduzida por Chico Mattoso, a mesma tradução da edição da Editora Globo, pelo selo Biblioteca Azul) e gosto de ressaltar esse ponto, já que existe aquela falsa impressão, ou balela, de que livros clássicos são difíceis de ler por conta de um vocabulário de difícil compreensão.
- Uma pequena nuance com O diabo veste Prada
O estágio de Esther na revista de moda me fez lembrar da personagem Andy, a recém formada que vai sofrer horrores nas mãos da terrível Miranda Priestly em O diabo veste Prada. Mas as comparações são bem sutis: ambas as protagonistas saem de suas cidades pequenas, estudam e querem se tornar editoras, porém, acabam trabalhando em uma revista de moda, assunto este que não suportam por tanta futilidade, para terem a chance de indicação para outras vagas em jornais que realmente lhe interessam.
Eu era a correspondente universitária do jornal da cidade, editora de uma revista literária, secretária do Comitê de Honra — uma instituição bem popular, que lidava com delitos acadêmicos e sociais e suas punições —, tinha uma conhecida poeta e professora fazendo lobby para que eu conseguisse uma vaga na pós-graduação das maiores universidades da Costa Leste, com promessas de bolsas integrais até o fim do curso, e agora era assistente da melhor editora de uma revista intelectual de moda — e o que eu havia feito senão ficar empacada feito uma pangaré? (…)
– Você pode aprender muito neste mês na revista, sabe. Basta arregaçar as mangas. A moça que estava aqui antes de você não ligava muito pra desfiles de moda. Ela saiu daqui direto para a revista Time. (Pág. 36)
Mas, apesar das roupas de grife, dos brindes que recebiam e dos eventos de arrasar elas não suportavam o convívio com as pessoas fúteis e o trabalho que tinham que executar.
- A pressão autoimposta na vida acadêmica
A pressão que Esther colocava sobre si mesma foi um ponto que me chamou muito a atenção e eu acabei me identificando muito por estar numa universidade pública e me ver nessa situação. A protagonista tinha o interesse na área de humanas, principalmente literatura, e se inscrevia em matérias totalmente diferentes, mesmo não gostando, e a pressão por ótimos resultados lhe causarem mal. Ela ficava se cobrando tanto a ponto de não ter uma vida social e uma convivência saudável na universidade, passava o tempo todo trancada no quarto ou na biblioteca estudando freneticamente.
Eu tirei A em física, mas foi em meio a uma crise constante de pânico. Estudar aquilo me deixava doente. Eu não suportava a ideia de reduzir tudo a letras e números. Em vez de formatos de folhas e diagramas ampliados mostrando os buracos pelos quais as folhas respiram, além de palavras fascinantes como caroteno e xantofila, havia aquelas fórmulas hediondas e comprimidas, com letras que pareciam escorpiões, escritas com o giz vermelho especial do sr. Manzi. (Pág. 39)
Para muitos pode ser frescura, mas quero deixar o link desse artigo publicado no Jornal da USP: Estresse: quando a faculdade vira “máquina de moer gente”, talvez essa ideia pode ficar mais clara e compreensível. E acredito que provavelmente essas crises constantes de pânico podem ter desencadeado, entre outros fatores, a crise que levou a personagem aos momentos de depressão.
- Posicionamento feminista
Publicado em 1963, sob o pseudônimo de “Victoria Lucas”, e considerado de caráter autobiográfico, várias passagens destacam o posicionamento feminista da autora, na década em que o movimento de igualdade de gênero se consolidava no meio político nos Estados Unidos. Seja no mercado de trabalho:
O problema é que eu odiava a ideia de ter que trabalhar para homens. Eu queria ditar
minhas próprias cartas arrebatadoras. (Pág. 77)
A ideia do casamento:
Era sempre a mesma coisa: eu vislumbrava um homem sem defeitos à distância, mas assim que ele se aproximava eu percebia que não era bem assim. Essa é uma das razões por que nunca quis me casar. A última coisa que eu queria da vida era “segurança infinita” ou ser o “lugar de onde a flecha parte”. Eu queria mudança e agitação, queria ser uma flecha avançando em todas as direções, como as luzes coloridas de um rojão de Quatro de Julho. (Pág. 84)
Filhos e constituição de família:
Também lembrei de Buddy Willard dizendo com uma voz sinistra e sabichona que depois que tivéssemos filhos eu me sentiria diferente e não teria mais vontade de escrever poemas. E me ocorreu que talvez fosse verdade aquela história de que casar e ter filhos era como passar por uma lavagem cerebral, e que depois você ficava inerte feito um escravo num pequeno estado totalitário. (Pág. 85)
(…)
– Odeio a ideia de ficar sob a tutela de um homem – e eu havia dito à dra. Nolan. – Um homem não tem preocupação nenhuma no mundo, enquanto a possibilidade de ter um bebê paira sobre a minha cabeça como uma espada, me fazendo andar na linha. (Pág. 215)
A castidade sendo algo “imposto” diferente para homens e mulheres, não se aplica à personagem de Esther, que pensa diferente do padrão patriarcal em relação aos seus desejos carnais:
Podia até ser legal manter-se pura e casar com um homem puro, mas e se depois do casamento ele confessasse que não era pu-ro, como Buddy Willard tinha feito? Eu não conseguia suportar a ideia da mulher ter que seguir uma vida pura enquanto o homem vivia uma vida dupla, uma pura e outra não. (Pág. 82)
- A redoma de vidro como metáfora da depressão
Se em Tartarugas até lá embaixo, por John Green a protagonista utiliza a metáfora da espiral infinita para os seus momentos de pânico, Sylvia Plath explora outra metáfora para tratar de uma doença mental: a redoma de vidro, como se a personagem estivesse enclausurada dentro de si mesma:
Para a pessoa dentro da redoma de vidro, vazia e imóvel como um bebê morto, o mundo inteiro é um sonho ruim. (Pág. 232)
(…)
Eu sabia que devia ser grata à sra. Guinea, mas não conseguia sentir nada. Não teria feito a menor diferença se ela tivesse me dado uma passagem para a Europa ou um cruzeiro ao redor do mundo, porque onde quer que eu estivesse — fosse o convés de um navio, um café parisiense ou Bangcoc —, estaria sempre sob a mesma redoma de vidro, sendo lentamente cozida em meu próprio ar viciado. (…) Afundei no banco de veludo cinza e fechei meus olhos. O ar da redoma me comprimia, e eu não conseguia me mover. (Pág. 182)
- Um olhar sobre os tratamentos de choque
A temática da depressão é tratada no livro não só pelos sentimentos da protagonista, mas também a partir da internação de Esther, sendo muito chocante o tratamento da doença por choques elétricos. Mais uma vez somos lançados ao ponto de vista da loucura, como em O alienista, por Machado de Assis e Diário do Hospício + O Cemitério dos Vivos, por Lima Barreto, obras que retratam o clima nos hospícios. A redoma de vidro, acaba dialogando com estas obras quando percebemos mais um capítulo da história da psicologia, com uma visão (não muito prolongada) dos pacientes tanto no aspecto público, como no privado. Eu fiquei bem curiosa e tocada com esse tipo de tratamento, e pesquisando sobre o assunto encontrei um artigo do Dr. Drauzio Varella (vale muito a pena conferir) em que aborda o histórico do tratamento de eletrochoque para a cura da depressão, desde os princípio das técnicas brutais, semelhante às sessões de torturas de vítimas, até às técnicas mais avançadas e humanas da eletroconvulsoterapia. No livro de Sylvia Plath encontramos os dois procedimentos, que mostra Esther totalmente aterrorizada com a primeira técnica.
Por fim, posso dizer que diante dos pontos que levantei foi uma leitura que eu gostei sim e recomendo, mas, no final fiquei com uma pequena sensação de querer um pouco mais, por ser um livro tão falado.
Até o próximo post!
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Olá 😄. Adorei a sua resenha. Principalmente na intertextualidade com outras obras e pela sua análise. Fiquei muito interessada nesse tema da loucura e no livro “A redoma de vidro”. Abraços, Agnes
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Oies Agnes! Fico muito feliz por você ter gostado da resenha 🙂 Confesso que essa temática tem me chamado muito atenção, quem sabe aparece outros livros por aqui. E por favor, quando ler A redoma de vidro me diga o que achou, viu?! 😉 Bjos da Cah
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Poxa Cah, vc precisa parar de fazer essas resenhas tão boas, ou eu não vou dar conta de ler tantos livros…. Hehehehe! E lá foi mais um pra minha lista de leituras!!! Obrigada!!!!
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Oies! Mulher, não sabe o quanto fico feliz e realizada ao ver esse tipo de comentário, de vdd, muito obrigada e desculpa, rs Bjos da Cah ❤ ❤
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Caramba, que post lindo e completo! ❤ Adoro quando você analisa o livro assim! E A redoma de vidro, sem dúvidas, é uma obra que merece ser analisada! Eu adorei e tenho resenha dele no SLET (mas não tá completinha como a sua! Hahaha): https://sobrelivrosetraducoes.com.br/semana-da-mulher-a-redoma-de-vidro-de-sylvia-plath/
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Oies Brenda! Acredita que quando estava pensando na melhor forma de colocar as minhas ideias escritas voltei numa resenha dessa coleção e vi seu comentário dizendo que assim era mais didático? rs Então obrigada =D Vou conferir sua resenha 😉 Bjos! ❤
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[…] A Redoma de Vidro, por Sylvia Plath >> Este livro, além de todos os pontos que levantei na resenha é uma prova de que é possível ler livros clássicos durante maratonas literárias. […]
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[…] Eu amei escrever sobre este livro e fiquei ainda mais feliz com o retorno de vocês ❤ Confiram: Resenha | A Redoma de Vidro, por Sylvia Plath. […]
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[…] A Redoma de Vidro, por Sylvia Plath […]
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[…] justamente a forma dos tratamentos relacionados à depressão. E como não lembrar do livro A Redoma de Vidro, por Sylvia Plath em que uma das formas de tratamento era à base de choques […]
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[…] várias referências a livros, como A Redoma de Vidro, de Sylvia Plath, Iris Figueiredo deixou fez a diferença, deixando a sua mensagem clara e […]
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[…] Jovem: Uma viagem inesperada 3. Dreamland (Sarah Dessen) 4. Depois do azul (Élaine Turgeon) 5. A redoma de vidro (Sylvia Plath) 6. Memento: O mistério da lembrança adormecida (Diego A. Carvalho) 7. Azar o seu (Carol […]
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