Oies Bookaholics!
Mas o que é a Feira Miolo(s)?
Já imaginou uma feira repleta de livros dos mais variados tipos e formatos? Com mais de 150 expositores? Com espaço para debates e palestras? Com direito a música? E que durasse 12 horas seguidas?
Miolo(s) é um evento anual de arte gráfica. Organizado pela editora Lote 42e Biblioteca Mário de Andrade desde 2014, o principal objetivo é estimular e expor a produção de editoras, coletivos e artistas contemporâneos. Além de ser uma oportunidade para conhecer as publicações, durante a feira o público pode conversar com os próprios produtores.
Sobre o Esquenta Miolo(s)
A 4ª edição do evento contou com o Esquenta Miolo(s), na semana que antecedia o evento, com palestras sobre o mercado editorial independente. Eu participei no dia 6 do bate-papo “Editar é preciso, viver também é preciso” com os fundadores da Lote 42, João Varella e Cecilia Arbolave, com dicas a partir dos erros e acertos durante o 5 anos da editora. O casal começou a palestra desmistificando o cotidiano de uma editora, os bastidores, os problemas e as burocracias que mostram o outro lado ao se produzir, publicar e vender livros, isso porque só vemos o resultado final dos livros bonitos, sem ter uma noção do quanto o processo muitas vezes não é tão fácil.
Eles apontaram 7 dicas, baseadas nos livros que fazem parte do catálogo da editora, e que vou tentar resumir nesse post. Let’s go?!
1. Importância do trabalho do editor
Entender o porquê do trabalho: Editor é o primeiro leitor, além de ter uma relação de amizade com o escritor, serve de “meio de campo” entre a editora, mesmo porque no Brasil o espaço dos agentes literários ainda é limitado.
2. Ser criativo sem ter recursos disponíveis
Dica para eliminar todo os “mimimis” durante os processos por conta da falta de dinheiro. O exemplo utilizado foi do livro Indiscotíveis:
Lançado em 2014, Indiscotíveis retrata 14 discos clássicos da música brasileira. A seleção é eclética tal qual a sonoridade do País. Vai da leveza de Acabou Chorare, dos Novos Baianos, até o peso-pesado Roots, do Sepultura. Claro que muita coisa boa ficou de fora, mas os selecionados de Indiscotíveis são indiscotíveis. Cada capítulo do livro traz um ensaio de um autor diferente sobre um dos álbuns. Os escritores tiveram liberdade para expressar sua relação com as obras musicais, o que reforçou ainda mais a diversidade. Há desde argumentos técnicos racionais até histórias pessoais carregadas de emoção. O projeto gráfico faz referência aos EPs de sete polegadas: os 14 capítulos foram divididos em sete livretos de 18 x 18 cm, com lados A e B. Uma capa os envolve, tal qual os vinis de antigamente.
Indiscotíveis é o livro nº 6 da Lote 42.
A ideia original seria publicar cada capítulo em um livreto, mas o preço de produção estava muito alto, assim, a ideia adotada foi colocar dois capítulos por livreto, lado A e lado B, como os próprios discos de vinil. Eles destacaram também que estabelecer boas relações com os envolvidos na gráfica possibilitam soluções e dicas para os problemas. Outro exemplo citado foi a promoção que fizeram durante a Copa do Mundo de 2014, já que a editora não tem dinheiro para publicidade (como as grandes marcas), a cada gol sofrido pelo Brasil seria dado um desconto de 10% na compra dos livros, então pensem no quanto conseguiram vender no inesquecível 7×1 contra a Alemanha. (Confiram: Loja cumpre desconto de 10% por cada gol sofrido pelo Brasil).
3. Não ter medo de fazer diferente
Neste caso o primeiro exemplo foi a Banca Tatuí, em que são realizadas venda de livros fora de uma livraria tradicional, sonho do editor João Varella. O livro que destacaram foi Queria ter ficado mais:
Queria Ter Ficado Mais reúne 12 histórias escritas por mulheres em diferentes cidades do mundo – da vizinha Buenos Aires à longínqua Tóquio. Com textos autorais, sensíveis e envolventes, são viagens que vêm dentro de envelopes, como cartas enviadas de diversos pontos do globo para um único destinatário: você. Em todos os livros, a Lote 42 tenta explorar a dimensão física do livro. O projeto gráfico do Queria Ter Ficado Mais, desenvolvido pela designer Luciana Martins, dialoga com o universo das viagens: cada um dos capítulos foi impresso em folhas soltas, dobradas e acomodadas dentro de envelopes, como se fossem cartas enviadas dos lugares que as autoras visitaram. Aquarelas da ilustradora Eva Uviedo, inspiradas nos textos, apresentam as regiões retratadas antes de o leitor embarcar na leitura, além de trazer mais um toque feminino ao conjunto. Por fim, uma cinta ainda amarra os 12 envelopes e permite que os envelopes se misturem e ganhem uma nova ordem a cada leitura.
Esse livro foi desenvolvido a partir de um formato totalmente diferente do padrão tradicional do livro.
4. Dominar seu meio
Bernice corta o cabelo serviu como referência à ideia de que eles poderiam produzir livros não só nacionais, mas fazer traduções de obras clássicas. Além disso, na edição o fitilho utilizado como marcador de página imitava cabelo, a partir das linhas que sobraram durante o processo de produção.
Tudo que podemos fazer pelas pessoas é alimentá-las, diverti-las ou chocá-las. Essa frase, atribuída a Oscar Wilde, dá a tônica desta história de F. Scott Fitzgerald, de 1920, mas ainda atual, pertinente e necessária. Pela trama de Bernice e sua prima Marjorie em uma disputa por popularidade, pertencimento social, status e atenção de garotos, o leitor acompanha as peculiaridades e sutilezas do universo adolescente em seu máximo estado de tensão, com suas descobertas e frustrações. Traduzido por Juliana Cunha e aqui apresentado em versão integral, com ilustrações de Mika Takahashi, Bernice Corta o Cabelo nos transporta a um momento da história marcado pelo jazz, pelos bailes e pelo dinheiro. O conto escancara o jogo das relações sociais de um grupo de adolescentes ricos: o ambiente em que cada um se encontra, onde são vistos, notados, e avaliados. Roupas, festas, cortes de cabelo e, enfim, palavras.
5. Para publicar não precisa da permissão de ninguém
Valfrido? resume bem:
O livro Valfrido? une, embaralha e questiona os universos de ficção e não ficção ao apresentar o relato de uma história entregue por malas diretas e placas de rua para nove mil pessoas (que não a solicitaram) e que, aqui, serve também como ponto de partida para outra narrativa, na qual temas como a relação entre texto e design são discutidos livremente.
Em fins de outubro de 2015, os moradores de nove mil residências nos bairros de Santa Cecília e Higienópolis, em São Paulo, passaram a receber em suas casas (sem que houvessem solicitado) uma série de folhetos entregues por mala direta, denunciando os supostos trambiques de um certo Valfrido. Pouco mais de um mês e dez folhetos depois, tudo se encerrou. Sem as devidas explicações ou, ao menos, algum final minimamente conclusivo. Os folhetos foram todos impressos em offset na GIV — gráfica online na qual é impossível não apenas alguma customização ou acompanhamento de produção, como também qualquer contato com outros seres humanos. Inicialmente, todos seriam entregues pelo sistema de Mala Direta Básica, dos Correios. Contudo, logo após o envio do primeiro folheto (ou melhor: logo após concluirmos que ninguém havia recebido o primeiro folheto), descobrimos a existência de uma espécie de “máfia dos porteiros” que bloqueava qualquer correspondência comercial sem destinatário específico que não oferecesse algum tipo de “agrado” aos mesmos. Insistimos mais uma vez mas, ao perceber que o segundo folheto teve o mesmo destino, fomos obrigados a rever todo o sistema de entrega (transformando-o num processo caótico e infernal).
Conforme a história criada pela sequência de folhetos avançava, objetos nela mencionados começavam a surgir, aqui e ali, pelas ruas ao redor, complementando a narrativa.
A entrega das filipetas, cartazes colados e toda a divulgação foram realizados sem a necessidade de pedir a permissão à Prefeitura ou qualquer outro órgão público e/ou empresa. Para maiores detalhes, confiram o minidoc do projeto.
6. Ousadia total no Word e economia no Excel
A impressão do livro Inquérito Policial: Família Tobias precisou passar por 4 gráficas para que os custos de produção fossem reduzidos.
O ponto de partida do livro Inquérito Policial: Família Tobias é o arquivamento de um inquérito real que investiga o autor, Ricardo Lisias. Ele descobre que os denunciantes foram João Varella, Cecilia Arbolave e Thiago Blumenthal, sócios da editora Lote 42, na mera intenção de ajudá-lo numa crise criativa e assim viabilizar a publicação de um livro. Lísias, então, solicita a abertura de uma investigação na Polícia Federal contra a editora. O novo inquérito traz declarações de um dos sócios, do próprio autor, provas, a árvore genealógica da família — com um histórico que remonta ao século XIX –, e as respectivas histórias da quarta geração: do cineasta João Tobias (morto de forma trágica no Equador), do artista Fernando Tobias e da estilista Mariana Tobias. A obra une textos, imagens e documentos. O projeto gráfico, assinado pela Casa Rex, de Gustavo Piqueira, recria a estética e formato de um inquérito policial: o livro apresenta as provas impressas em tamanhos diferentes e fixadas a uma pasta com um grampo metálico.
E o projeto gráfico, assinado por Gustavo Piqueira, da Casa Rex, toma como ponto de partida a estética e formato de um inquérito policial, sem limitar-se à simples tentativa de reprodução de um processo original, mas brincando em cima de suas possibilidade e limites formais. O livro reúne as provas impressas da investigação de Ricardo Lísias contra a Lote 42, fixadas a uma pasta com um grampo metálico. Em papel pólen, porém com fundos, cores e formatos diferentes, as partes do livro extrapolam o limite da pasta, exacerbando o aspecto burocrático dos inquéritos.
7. Ter clareza do que se quer como editora
Quais são as motivações, mesmo que as ideias e projetos mudem ao longo do tempo. E o destaque foi o livro Novos Mafuás, produzido e publicado durante os 4 dias da FLIP deste ano. Um livro com crônicas do homenageado: Lima Barreto. E para a minha grande alegria fui sorteada e esta obra de arte faz parte da minha coleção ❤ ❤
Eu fiquei bem impressionada com “os segredos” revelados durante a palestra, com essa noção e preocupação em compartilhar experiências, fortalecendo o mercado das editoras independentes. Quando abriram o debate para perguntas perguntei quais as diferenças entre as editoras tradicionais e as independentes, principalmente em relação às ideias de publicidade e uma possível estagnação no mercado editorial. Resumindo um pouco do que o João respondeu, ele apontou as ideias de parceria com blogs e booktubers como estratégia viciada, já que pelo que ele pesquisou, esses canais não representam muito o número de vendas de livros, destacando também que o problema dessa possível estagnação era mais ligado ao pouco hábito de leitura de uma geração interessada em outros meios (tecnológicos principalmente), sendo necessário uma educação de novos leitores. Em relação ao mercado de editoras independentes, não há como mensurar, pois ainda não há pesquisas desse nicho, mas o que se percebe ao logo dos anoso aumento do números de feiras dentro e fora do país, tanto que nessa edição da Miolo(s) haviam mais de 150 editoras expondo e vendendo os seus trabalhos.
Outra pergunta muito interessante foi sobre como a editora Lote 42 escolhia os títulos para serem publicados, quais eram os filtros, e segundo eles, a primeira questão era qual a relevância da obra, e qual a sacada que consegue tornar aquele livro importante. Eles também ressaltaram o trabalho colaborativo e parceria com os autores, e destaquem também que tem ideias muito amplas, não conseguem definir um segmento ou assunto específico, como também a impossibilidade de prever o número de tiragem, não existe um fórmula exata.
Sobre a feira: preços, diversidade e palestra
Eu infelizmente não fiquei muito tempo na feira e nem comprei nada, mas foi uma experiência incrível! 🙂 Eu acho importante falar sobre os preços, é preciso levar em conta que a grande maioria dos livros vendidos foram feito fora dos modelos tradicionais e muitos inclusive, de forma artesanal e em número limitado de tiragem, sendo até uma espécie de livro de colecionador. Confesso que fiquei muito surpreendida com os valores dos livros da Editora Carambaia, que não tem segue uma linha mais artesanal, mas que publica apenas 1000 exemplares de edições que não serão mais encontradas no mercado. Então, para alguns os preços poderiam ser extremamente caros, mas omo mensurar o valor do trabalho de um artista, sabe?
Durante a feira também aconteceram palestras sobre arte gráfica, publicação independente e circulação. Eu participei da primeira palestra “Arte impressa, onde está e para onde vai?” com o João Varella, que destacou a cultura brasileira ao misturar diversos elementos como prática em vários segmentos, a criatividade nacional. O editor também destacou a “onda” de realização de feiras de editoras independentes a partir de 2012 em todo o país, e daí surgiu a Miolo(s), num desafio à Biblioteca Mário de Andrade, sendo a 2ª maior biblioteca do país que precisava acompanhar esse novo movimento. João também apontou que as feiras são como uma ponta de distribuição dos livros com uma maior e contato entre autor e leitor, relação que não é possível numa livraria tradicional.
Pela sua experiência como editor, palestrante e vendedor de livros dentro e fora do país, fez algumas previsões sobre o mercado: como a profissionalização, um maior contato com um público mais jovem e um possível encontro de editoras independentes e tradicionais em eventos. Como a palestra era sobre a arte impressa, também foram levantadas as questões dos e-books e e-readers, que segundo o palestrante não é um meio que vai crescer no Brasil, ele reconhece a praticidade do Kindle, mas algumas vantagens se tornam desnecessárias ao longo da experiência de leitura, como a opção de alteração de fonte e espeçamento, já que quando o leitor se adequar aquela que ele mais se sente confortável, não vai mais necessário ficar alterando para cada livro, além da ideia de contato e apego com o livro físico.
A criatividade em cada mesa era de fazer os olhos brilharem, não só limitado ao objeto livro, mas também repleto de posters, cadernos, cartões, roupas, kits para desenho / ilustração, área destinada ao público infantil, a Miolinho(s). Eu fiquei babando pela diversidade, temas e assuntos presentes, capaz de sair falida, rs.
Só por curiosidade, eu queria dizer que vi pelos corredores da feira (e não tive coragem suficiente de falar) o Sr. Charles Cosac, o ex-editor da Editora Cosac Naify extinta em 2015 (confiram: maiores detalhes) e que está à frente da Biblioteca Mário de Andrade, trabalhando gratuitamente, além dos gêmeos Fábio Moon & Gabriel Bá, que estavam entrando como ouvintes na segunda palestra do dia sobre quadrinhos e ilustração independentes na Inglaterra, buscando mais conhecimento na área em que atuam.
Dizer que eu adorei o evento seria pouco, dizer que fiquei encantada também não seriam suficientes: um evento para profissionais e empreendedores do livro, um evento para os aspirantes e amantes da editoração, um evento para todos os apaixonados por livros e artes.
Até o próximo post!
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Adorei o post! Vou compartilhar!
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Obrigadaa Brenda! =D ❤ Bjos
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Eu ainda quero poder participar desta feira, sempre fico babando com as fotos! Já faz um tempinho que acompanho o trabalho de algumas editoras independentes e a Lote 42 tem um espaço especial no meu coração, admiro demais o trabalho da mesma e um dos títulos que está na minha listinha é “Queria ter ficado mais”, ele é lindo demais!
Ótimo post!Adoro quando compartilha informações e fotos dos eventos que comparece! ❤
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Bia, enquanto vc sofre por não poder participar eu sofro por não conseguir comprar tudo que eu vejo hahaha. Mas a Lote 42 é tão incrível, sou apaixonada não só pelos livros, mas pela história, criatividade e por compartilharem sabe? Se eu te contar que consegui comprar “Queria ter ficado mais” hj na Festa do Livro da USP? Não resisti, estava na metade do preço, rs. Posts sobre eventos são os que me dão mais trabalho (até demoro um pouco mais pra fazer, rs), mas ver comentários assim como os seus me animam, rs. 😉 Bjos ❤
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[…] pensei que não tivesse ido a nenhum evento, mas sim, rolou a Feira Miolo(s) 2017: A Feira da Arte Gráfica na Biblioteca Mário de Andrade, fiz um post sobre a minha Wishlist Black Friday: 10 Livros Desejados, bem como o Book Haul | […]
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[…] – Feira Miolo(s) 2017: A Feira da Arte Gráfica na Biblioteca Mário de Andrade […]
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[…] que frequentei a edição Feira Miolo(s) 2017) fiquei bem ansiosa para a edição desse ano! Organizada pela Editora Lote 42 em parceria com a […]
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[…] admiro muito o trabalho desenvolvido, e muito do que ele falou no encontro está melhor explicado nesse post que fiz sobre a Feira Miolo(s) 2017, como a produção de diversos títulos da editora. Além disso, João assim como Cid, destacou que […]
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